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O Ressurgir do Passado- Vale do Jacareí

Casa que reapareceu com a diminuição da água
Assim como esperado no ano de 1880 o vale do Jacareí, situado no município de Joanópolis no Estado de São Paulo, foi inundado pelo represamento de suas águas. A construção do lago do Jaguari-Jacareí foi iniciada em 1977 e contou com cerca de 1.100 operários. Tal vale que possuía grande importância estratégica, econômica, social e produtiva.
As terras altamente férteis do local permitiam as famílias viver da agricultura e da pecuária. As inúmeras olarias espalhadas resumiam a importância e a alta valorização do barro do Jacareí.
Cruzando por essa terra rica existiam duas estradas, uma ligando Joanópolis a Piracaia e outra ligando Bragança Paulista a Joanópolis. Ambas sinuosas e margeadas pelos rios tendo em cada curva uma barricada para evitar que as águas a inundassem.
Antiga Estrada Joanópolis\Piracaia
Os moradores locais já conheciam o potencial da região e em futuro bem distante já se acreditava e se falava no seu represamento.
E um dia esse futuro tão distante se tornou realidade.  As pouco mais de mil famílias já sentiam que o seu fim estava próximo. E para fomentar ainda mais essa ideia, por volta de 1975 é iniciada a desapropriação pelo advogado da Sabesp, munido no Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941. (MORAIS, 2010, p.70)
Nível do Rio Jacareí
Segundo Morais (2010, p. 79), na época da desapropriação o advogado da Sabesp chegava e avaliava a propriedade e em seguida fazia a oferta, se o proprietário aceitasse em poucos dias o valor seria debitado, caso contrario ele teria que brigar por longos anos na justiça. Mas o medo de perder suas terras para o governo fazia que muitos aceitassem a proposta.
Alguns proprietários, com um pouco mais de instrução, vendo uma apreciação maior das propriedades com algum tipo de agricultura começaram a plantar para aumentar o valor de suas posses.
Entrada de uma antiga propriedade
Embalado pela briga na justiça e pela falta de documentos que comprovassem a pose da terra, muitos proprietários ainda não receberam o valor prometido e esperam a decisão judicial para receber a indenização. (MORAIS, 2010, p. 93)
Então a sonhada benfeitoria do Governo se concretizou, a construção da maior represa do Sistema Cantareira. As maquinas vieram, cortaram as árvores e boa parte da vegetação para que a mesma não consumisse o oxigênio da água. Algumas casas foram demolidas pelos próprios proprietários, outras foram inundadas.
Restos de Construção
O jornal da época (Estado de São Paulo, 22/05/1980) já anunciava que as duas estradas que ligavam Joanópolis aos outros municípios iriam desaparecer do mapa e com ela o vale do Jacareí, gerando a necessidade da construção de outras estradas. Assim nasceu a estrada Entre Serras e Águas (Estrada dos Bandeirantes), ligando Joanópolis, a Bragança Paulista, e a estrada entre Joanópolis e Piracaia, ambas contempladas com a belíssima vista do represamento do Jaguari-Jacareí.
A construção da represa foi uma das grandes propulsoras do turismo municipal, uma vez que mais de dez pousadas foram instaladas ao seu redor e os hospedes e turistas praticavam o turismo de aventura, turismo náutico e turismo de pesca. Além da bela vista ser o cartão postal do turismo ela foi utilizada para aumentar a especulação imobiliária.
Na época a região da Serra da Mantiqueira já era denominada como sertão, dado pelo período de estiagem e de grandes chuvas. A última seca foi no ano de 2001, que fez renascer parte das estradas perdidas.
Pequenas poças que compõe o atual nível da represa
Já a seca mais atual está acontecendo neste instante, uma das piores da história. Em virtude disso o tema da 7º Semana do Meio Ambiente de Joanópolis teve como tema a seca. Movidos pelo caráter histórico, ambiental e social do vale, foi agendado uma caminhada no sábado de manha (07/09), conduzida pelo técnico e engenheiro ambiental Diego Toledo.
Por mais incrível que possa parecer às estradas que cortavam essa região no passado ressurgiram, e com elas todas as lembranças do passado emergido pela água.
A estrada renasce como se o tempo não estivesse corrido, as antigas pedras, antigas pontes e antigas barragens ressurgem como se nada tivesse acontecido, como se não tivesse passado mais de 30 anos do seu desaparecimento. Com a seca ressurgem as antigas cercas, muros, pastagens, portais de propriedades, casas e vestígios de construção.
Um erro histórico, ambiental e social não seria apagado facilmente como se nada tivesse ocorrido. A seca evocou as lembranças desse período, mexeu na ferida que não se cicatrizou e trouxe a outras problemáticas.
Na tese de mestrado da então Professora Me. Marta Aparecida de Oliveira de Morais ela conclui com a seguinte reflexão:
O país exige que a sociedade se prive, muitas vezes de seus territórios, de seus valores históricos, afetivos e culturais, em favor do desenvolvimento econômico. A construção de represas tem como objetivo atender um grande número de pessoas, porém uma minoria tem que “abandonar” seus “lugares” em favor dessa maioria; o grande problema está na troca de benefício, no qual muitas pessoas nada receberam em nome desse desenvolvimento, ou ainda aguardam a decisão da justiça para receber indenizações. (MORAIS, 2010, p. 93)
Área que era toda coberta por água
Tal reflexão nos remete novamente ao passado. Assim como falado anteriormente o erro não seria apagado com o tempo, o que o tempo pode ter feito é amenizado os seus impactos, mas agora o que antes foi sinônimo de progresso e desenvolvimento estadual e federal, não passa de um mero campo aberto a espera da chuva.
Fazendo uma analogia ao campo aberto a espera de chuva está à memória das antigas famílias, que possuem uma ferida aberta a espera de respostas e soluções.

AGRADECIMENTO
Gostaria de agradecer a Professora Me. Marta Morais que com grande empenho me auxiliou e me enviou a sua tese de mestrado que possui como titulo “O Sistema Cantareira e a análise de impactos socioambientais da construção da represa do Jaguari-Jacareí, São Paulo.”. Tal apoio foi essencial para construir essa matéria.
Também gostaria de agradecer ao Técnico e Engenheiro Ambiental Diego Toledo por conduzir o grupo até a antiga estrada, e pela riqueza de informações de caráter histórico, ambiental e social do local.


Matéria Publicada na Revista Bragantina On Line.

















REFERÊNCIAS

MORAIS, M.A.O. O Sistema Cantareira e a análise de impactos socioambientais da construção da represa do Jaguari-Jacareí, São Paulo. 2010. 105p. Dissertação de Mestrado. Pontifica Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.



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